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A Terra já foi atingida por meteoro do tamanho de quatro Montes Everest

Pela primeira vez, cientistas traçam um panorama detalhado do que aconteceu após o impacto – e por que ele pode ter sido bom para a evolução da vida na Terra

Por Bela Lobato
26 out 2024, 18h00

Há 3,26 bilhões de anos, um meteoro do tamanho de quatro Montes Everest se chocou com o planeta. Ele é 200 vezes maior do que o famoso meteoro que extinguiu os dinossauros há 66 milhões de anos. O impacto conhecido como S2 provocou um tsunami, ferveu as águas do oceano e afetou profundamente a história da vida na Terra.

Sabemos disso graças ao chão do Cinturões de Rochas Verdes, na África do Sul. Foi para lá que a pesquisadora Nadja Drabon, da Universidade de Harvard, partiu com a sua equipe. Durante três expedições, a equipe coletou pedrinhas esféricas que encontravam no chão, que eram a chave para entender toda essa história. 

Apesar de ser conhecido desde os anos 80, é a primeira vez que sabemos tantos detalhes sobre o S2. Por não ter deixado uma cratera, por muito tempo existiam dúvidas se a formação rochosa indicava mesmo uma colisão daquela proporção. Mas são muitas as evidências: o solo da África do Sul tem uma conservação excepcional, que funciona como uma máquina do tempo.

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As amostras de solo coletadas foram analisadas por meio de alguns métodos: o estudo dos sedimentos, a geoquímica e a composição de isótopos de carbono. Assim, os pesquisadores conseguiram traçar um panorama do que aconteceu naquela ocasião.

Naquela época, a Terra não era como a conhecemos. Ainda não existiam continentes, e quase toda a superfície do globo era coberta de água. A vida já existia, mas era bem simples e menos abundante, composta unicamente de microorganismos de uma célula só.

Como foi o impacto?

Pense no impacto gerado quando alguém pula violentamente em uma piscina. Agora, ao invés de uma pessoa, imagine um meteorito que tinha entre 37 e 58 quilômetros de diâmetro. “Foi um tsunami maior do que qualquer coisa que os humanos já viram.”, disse Drabon em entrevista à Super.

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O deslocamento da água inundou regiões secas, e secou o fundo do mar. O calor liberado pelo impacto não só aqueceu o ar da atmosfera em mais de 100ºC, mas também fez com que a camada mais superficial do oceano evaporasse. 

Ainda mais do que isso: o calor pulverizou as rochas do próprio meteorito. Assim surgiu uma nuvem de poeira que circulou ao redor do globo, o que escureceu os dias por um bom tempo. 

Ao entrar na atmosfera, os minerais do meteorito passaram por transformações físicas rápidas e radicais que culminaram nas pedrinhas redondas que a equipe de Drabon coletou na África do Sul. Elas são compostas por metais extraterrestres, que não existem naturalmente no nosso planeta e só podem ter sido originados de um choque com um corpo celeste.

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Nas águas rasas, as altas temperaturas, mudanças de maré e a escuridão atmosférica tornaram impossível que os microorganismos fizessem fotossíntese. Mas o fim do mundo é sempre o fim de um mundo, e o começo de outro. 

O recomeço da Terra

Após o impacto, a vida bacteriana se recuperou rapidamente. O movimento dos oceanos misturou regiões ricas e pobres em ferro, o que funcionou como um fertilizante natural para as bactérias. 

“Dá para ver esse aumento do ferro claramente nas rochas. Elas passam de listras pretas e brancas para um tom bem avermelhado”, explica Drabon. “Assim, o tsunami trouxe ferro enriquecido para a superfície e esse ferro também pôde ser usado por micróbios. Essa é, na verdade, uma maneira muito boa de os micróbios ganharem a vida. Eles obtêm muito mais energia do uso do ferro do que de muitos outros elementos.”

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Também houve um aumento expressivo na quantidade de fósforo disponível na superfície: uma parte vindo do desgaste e erosão do solo, outra vinda da composição mineral do meteorito. Esse elemento também serviu de combustível para a recuperação dos microrganismos.

“Esse meteorito era um condrito carbonáceo, um tipo que pode conter bastante fósforo. E o fósforo é um nutriente absolutamente bioessencial. A vida realmente precisa de fósforo”, diz Drabon. “Antes do impacto, os oceanos provavelmente eram bastante limitados em fósforo. Assim, com o impacto, o meteoro forma uma nuvem de vapor que vai chover em todo o mundo, e funciona como uma bomba de fertilizante, colocando muitos nutrientes no meio ambiente.” 

As bactérias capazes de metabolizar o ferro teriam, então, florescido logo após o impacto. “Sempre há essa percepção de que os impactos de meteoritos são simplesmente desastrosos, que acabam com tudo. E foi assim que os dinossauros morreram, certo? Mas temos de lembrar que a vida era muito diferente naquela época e que qualquer evento negativo terá aspectos positivos para algumas formas de vida.”, diz Drabon. 

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“Como os impactos eram mais frequentes durante os primórdios da Terra, toda vez era como se alguém colocasse um monte de fertilizante nos oceanos. Isso foi realmente muito bom para a evolução da vida durante esse período.”, acrescenta.

O estudo foi publicado no dia 21 na revista PNAS. A pesquisadora diz que ela e sua equipe terminaram essa parte da pesquisa com várias novas perguntas, que devem motivar novas investigações.

“Por exemplo, só analisamos o impacto S2, mas há uma série de outros eventos de impacto registrados nessas rochas. Como a vida respondeu a esses impactos? Nós analisamos principalmente o ferro e o carbono, mas e o enxofre? Observamos alguma mudança no enxofre durante o evento de impacto? E o que isso nos diz sobre a resistência dos micróbios que utilizavam enxofre? Eu poderia continuar…”, diz Drabon, empolgada.

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