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Homo sovieticus (em latim: "Homem soviético", em russo: Хомо советикус) é um termo que refere-se de forma crítica ao estereótipo das pessoas medianas da antiga URSS (e do bloco do Leste em geral), que teriam certos esquemas mentais e socioeconômicos específicos, derivados da doutrinação e da própria cultura política dos governos comunistas do denominado "socialismo real", estabelecidos na antiga URSS e na Europa oriental durante várias décadas do século XX.

Origem

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Este termo foi popularizado pelo conhecido escritor e sociólogo Aleksandr Zinovyev, autor do livro Homo sovieticus.[1] Um termo similar em russo coloquial é sovok (literalmente, ) (совок, plural: sovki, совки) que é derivado de "soviete" (literalmente, conselho).

Michel Heller afirma[2] que o termo foi cunhado na introdução da monografia de 1974, Sovetskye lyudi ("povo soviético") para descrever o próximo nível da evolução humana alcançado graças ao sucesso do experimento social marxista (ver: Engenharia social).

No livro publicado em 1981, disponível desde os anos 1970 através do sistema de burla de censura samizdat, Zinovyev também cunhou a abreviatura homosos (гомосос).[3]

Características gerais

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A ideia de que o sistema soviético criaria um novo tipo melhor de povo soviético foi postulada pela primeira vez pelos defensores do sistema, o chamado "novo homem soviético". Homo sovieticus, no entanto, era um termo com conotação negativa, inventado por adversários para descrever o que estes afirmavam ser o resultado real das políticas soviéticas. De muitas formas, isso significava o oposto do novo homem soviético, alguém caracterizado pelo seguinte:

  • Indiferença pelos resultados de seu próprio trabalho e baixa produtividade no mesmo, expressas na famosa piada soviética: "Eles (burocratas e políticos) fingem pagar-nos e nós fingimos que trabalhamos."
  • Falta de iniciativa e evitar tomar qualquer responsabilidade individual sobre qualquer coisa. Jerzy Turowicz escreveu: "este é um indivíduo escravizado, incapacitado, privado de iniciativa, incapaz de pensar criticamente, ele espera (e exige) que tudo seja fornecido pelo Estado, ele não pode e não quer tomar seu destino em suas próprias mãos".[4][5]
  • Indiferença para com a propriedade comum no local de trabalho, tanto para uso pessoal quanto para o lucro.[6] A frase de uma música popular, "Tudo que pertence ao kolkhoz, pertence a mim" (всё теперь колхозное, всё теперь моё / Vsyo teperь kolkhoznoe, Vsyo teperь moyo), significando que as pessoas em fazendas coletivas consideravam-se donas de todos os bens comuns, às vezes era usada ironicamente, para se referir a casos de pequenos furtos.
  • As restrições ao turismo no exterior e a censura soviética rigorosa aos meios de comunicação (assim como a abundância de propaganda) com o objetivo de isolar o povo soviético da influência ocidental. Existiam "listas de proibição" não públicas de artistas e bandas ocidentais, que, para além dos critérios usuais de não conformidade com os valores fundamentais soviéticos, foram acrescentados à lista por razões bastante peculiares; um exemplo disso sendo a banda irlandesa U2, cujo nome assemelhava-se ao Lockheed U-2, um avião de reconhecimento estadounidense de grandes altitudes. Como resultado, a "exótica" cultura popular ocidental tornou-se mais interessante precisamente por ser proibida. Devido à exposição limitada, artistas considerados de menor expressão no Ocidente eram supervalorizados na esfera soviética. Funcionários soviéticos chamavam este fascínio "idolatria ocidental"/"idolatria do Ocidente" (идолопоклонничество перед Западом / idolopoklonnichestvo Pered Zapadom).
  • Na opinião de um ex-embaixador dos EUA no Cazaquistão, uma tendência a beber muito: "[o ministro da defesa cazaque] parece apreciar liberar-se no verdadeiro estilo Homo sovieticus, isto é, bebendo até um estado de estupor."[7]
  • De acordo com Leszek Kołakowski, a publicação de propaganda A História do Partido Comunista da União Soviética (Bolcheviques) (Краткий курс истории ВКП(б) foi fundamental na formação das características (sociais e mentais) do Homo Sovieticus como um "livro de falsa memória e duplipensar". Ao longo de anos, os soviéticos foram forçados a repetir continuamente e aceitar as constantes mudanças nas edições do "curso curto", como este livro era conhecido, com cada edição apresentando uma versão ligeiramente diferente dos acontecimentos passados. Isto levou inevitavelmente à formação de "um novo homem soviético: ideológicamente esquizofrênico, "mentiroso honesto", sempre pronto para automutilações mentais constantes e voluntárias".[8]

Ver também

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Bibliografia

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Referências
  1. BBC News - Soviet-era satirist Zinovyev dies. 10 de Maio de 2006. (em inglês) Acessado em 06/01/2016.
  2. Cogs in the wheel: the formation of Soviet man. Autor: Mikhail Geller. Knopf, 1988, (em inglês) ISBN 9780394569260 Adicionado em 06/01/2016
  3. New Lithuania in Old Hands: Effects and Outcomes of EUropeanization in Rural Lithuania. Autora: Ida Harboe Knudsen. Anthem Press, 2013, pág. 20, (em inglês) ISBN 9781783080472 Adicionado em 06/01/2016.
  4. Turowicz, Jerzy (1993). "Pamięć i rodowód". Tygodnik Powszechny (45).
  5. Liberi sine fano.
  6. Roca Arquivado em 27 de julho de 2011, no Wayback Machine. - Orthodox America. 1917-1987: Unsuccessful and Tragic Attempt to Create a "New Man". Sergei Khodorovich. (em inglês) Acessado em 06/01/2016.
  7. The Globe and Mail - Vain, shady and stupendously fat: Latest WikiLeaks like a teen's diary. Greg McArthur, 29 de Novembro de 2010, (em inglês) Acessado em 06/01/2016.
  8. Main Currents of Marxism: The Founders, the Golden Age, the Breakdown. Autor: Leszek Kolakowski. W. W. Norton, 2007, (em inglês) ISBN 9780393329438 Adicionado em 06/01/2016.