Almostacfi
Almostacfi | |
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Miralmuminim | |
Dirrã de Almostacfi cunhado em 945 | |
22.º califa do Califado Abássida | |
Reinado | Setembro de 944 – 29 de janeiro (ou 9 de março) de 946 |
Antecessor(a) | Almutaqui |
Sucessor(a) | Almuti |
Nascimento | 11 de novembro de 908 |
Baguedade | |
Morte | setembro de 949 |
Baguedade | |
Descendência | Maomé ibne Almostacfi |
Dinastia | abássida |
Pai | Almoctafi |
Mãe | Gusne |
Religião | Islão sunita |
Abu Alcácime Abedalá ibne Ali (em árabe: أبو القاسم عبد الله بن علي; romaniz.: Abu'l-Qāsim ʿAbdallāh ibn Ali; 908 – setembro/outubro de 949), mais conhecido por seu nome de reinado Almostacfi Bilá[1] (em árabe: المستكفي بالله; romaniz.: al-Mustakfī bi'llāh, lit. 'Desejando estar satisfeito somente com Deus'[2]) foi o califa do Califado Abássida em Baguedade de 944 a 946. Era um filho mais novo do califa Almoctafi e, portanto, um rival da linha do califa Almoctadir que reinou em 908-944, um período durante o qual o Califado Abássida quase entrou em colapso, e os califas tornaram-se fantoches nas mãos de senhores da guerra rivais. O próprio Almostacfi foi instalado no trono por Tuzum, um general turco que depôs e cegou o califa anterior, Almutaqui. No vácuo de poder deixado após a morte de Tuzum em agosto de 945, Almostacfi tentou recuperar um pouco de sua liberdade de ação, iniciando medidas antixiitas, mas o mesmo vácuo permitiu que os buídas capturassem Baguedade. Almostacfi foi forçado a reconhecer os buídas como governantes legítimos e concedeu-lhes títulos de reinado, mas logo foi acusado de conspirar contra eles e deposto em janeiro (ou março) de 946. Passou os últimos anos de sua vida na prisão. Seu filho tentou reivindicar o califado em c. 968, mas falhou.
Vida
[editar | editar código-fonte]Primeiros anos e caráter
[editar | editar código-fonte]Almostacfi nasceu em 11 de novembro de 908,[3] filho do califa Almoctafi (r. 902–908) e de uma concubina grega, Gusne. É descrito pelos cronistas como amante de esportes e jogos e parcial para nabide (bebidas fermentadas). Diz-se que simpatizava com os xiitas e mantinha contato próximo com os aiarum (vagabundos e combatentes urbanos) de Baguedade.[4] Seus laços com o aiarum, e sua participação em jogos 'vulgares' era uma afronta aos setores mais piedosos da sociedade.[5]
Antecedente: declínio do Califado Abássida
[editar | editar código-fonte]Na década de 930, o outrora poderoso Califado Abássida entrou em declínio: suas províncias periféricas foram perdidas para dinastias locais, suas finanças em ruínas e senhores da guerra — os hamadânidas de Moçul, os baridis de Baçorá, os buídas do oeste do Irã, bem como vários homens fortes militares — competindo pelo controle da própria capital do califado, Baguedade, e o título de emir de emires (comandante-em-chefe), que carregava consigo o controle de fato sobre o governo abássida.[6][7] Ao mesmo tempo, a própria dinastia abássida foi consumida por rivalidades e lutas internas, principalmente entre os descendentes de Almoctafi, por um lado, e os de seu irmão e sucessor, Almoctadir (r. 908–932), por outro. Sob o filho de Almoctadir, Arradi (r. 934–940), três dos filhos de Almoctafi foram executados ou presos, enquanto o califa enfrentou desafios de dois de seus próprios irmãos e de outras linhagens colaterais de príncipes abássidas.[8]
O irmão de Arradi, Almutaqui (r. 940–944), foi elevado ao trono pelo emir de emires Bajecã. Ele tentou explorar as rivalidades dos senhores da guerra regionais para recuperar a independência e autoridade de seu cargo, mas suas tentativas falharam, e foi deposto e cegado pelo emir de emires Tuzum em setembro de 944.[9][10] Para o historiador do século XI Alcatibe de Baguedade, esse feito sem precedentes sinalizou o colapso final da autoridade do califa.[11] No lugar de Almutaqui, Almostacfi foi elevado ao trono, aos 41 anos.[4]
Reinado
[editar | editar código-fonte]A ascensão de Almostacfi significou a restauração da linha de Almoctafi ao trono após 36 anos, e desde o início o novo califa fez alusões deliberadas a seu pai: o nome do reinado escolhido deliberadamente ecoou o de Almoctafi, e diz-se que usou o cocar cerimonial de seu pai (o calançua) em sua entrada em Baguedade.[12] Isso, e a rápida nomeação de seu filho, Alboácem Maomé, como herdeiro aparente, mostram que Almostacfi pretendia com confiança imitar o reinado de sucesso de seu pai,[13] mas na realidade, o novo califa era um fantoche das tropas turcas, enfrentando um tesouro vazio, e com o caos resultante e a pobreza ameaçando até Baguedade com fome.[4] A única liberdade de manobra política que restava aos califas desse período era escolher com qual dos senhores da guerra vizinhos se aliar. Para os senhores da guerra, o califa era uma fonte de legitimidade, e um califa astuto poderia alternar seu apoio entre os diferentes senhores da guerra da mesma forma que seus predecessores haviam mudado seus vizires.[14]
Ao mesmo tempo, Almostacfi perseguiu potenciais rivais, na pessoa de Alfadle, o chefe dos filhos restantes de Almoctadir e irmão dos dois califas anteriores, Almutaqui e Arradi. Diz-se que Almostacfi e Alfadle já se odiavam durante sua estadia no Palácio Taírida como jovens príncipes. Quando Almostacfi foi entronizado, Alfadle prudentemente se escondeu, e o vingativo califa teve sua casa incendiada.[5][15] O novo regime em Baguedade foi ameaçado do leste e do sul pelos buídas, que se aliaram aos baridis de Baçorá.[4][16] Uma tentativa buída de capturar Uacite na primavera de 944 falhou, assim como um ataque a Baguedade enquanto Tuzum estava preocupado no norte no verão de 944. Na primavera de 945, os buídas conseguiram ocupar Uacite, mas depois que Tuzum concluiu a paz com os hamadânidas, eles foram forçados a recuar.[17]
Tuzum foi capaz de afastar vários adversários para manter o controle de Baguedade, mas morreu em agosto de 945 e foi substituído por seu secretário ibne Xirzade, que não gozava da mesma autoridade com as tropas.[4][18][19]. A fraqueza de ibne Xirzade foi rapidamente explorada pelo califa, que assumiu um novo título, o de imame legítimo (imame alhaque), para reforçar sua reivindicação à liderança islâmica. Também tomou medidas contra os seguidores xiitas, prendendo o líder xiita xafeíta, e demitiu juízes corruptos, incluindo o chefe cádi, Maomé ibne Abi Axauaride.[20] Encontrando-se incapaz de controlar a situação, ibne Xirzade solicitou a ajuda do Hamadânida Nácer Daulá em Moçul.[4] Nesse momento, o governador de Uacite rendeu-se ao líder buída Amade ibne Buia e juntou-se a ele em sua marcha sobre Baguedade.[21] Sem liderança, as tropas turcas da capital não fizeram preparativos para resistir. Ibne Xirzade e o califa se esconderam, emergindo apenas quando os turcos deixaram a cidade para se juntar aos hamadânidas. Quando um mensageiro de Amade ibne Bua chegou à capital, Almostacfi fingiu estar encantado com a chegada deles.[22]
Queda e morte
[editar | editar código-fonte]As forças buídas entraram em Baguedade sem oposição e, em 21 de dezembro, o califa foi forçado a reconhecer a autoridade buída. Amade recebeu o título honorífico de Muiz Daulá ("Magnificador da Dinastia"); títulos semelhantes foram concedidos a seus dois irmãos, Haçane (Ruquém Daulá, "Pilar da Dinastia") e Ali (Imade Daulá, "Suporte da Dinastia").[4][17][23] De acordo com o sistema de base familiar buída, o título de emir de emires passou não para Muiz Daulá, mas para o irmão mais velho, Imade Daulá, que era o emir chefe buída.[24] Como Almostacfi estava agora sob o controle buída, os hamadânidas imediatamente pararam de reconhecê-lo como califa e proclamaram sua lealdade ao ex-califa Almutaqui.[25][26] Almostacfi teria instigado alguns dos oficiais dailamitas dos buídas contra Muiz Daulá. Como resultado, foi deposto em 29 de janeiro de 946 (ou 9 de março, segundo outros relatos) por ordem de Muiz Daulá.[4] A razão dada para a deposição foi provavelmente um mero pretexto;[27] o historiador Harold Bowen chamou o ato de uma "necessidade política" que também era altamente simbólica, deixando claro onde o poder residia agora.[15]
Embora os buídas e seus seguidores fossem simpatizantes dos xiitas, Muiz Daulá preferiu não arriscar instalar um califa xiita (ou reconhecer os califas fatímidas ismaelitas), por medo de seus homens obedecerem ao califa e não a ele. Em vez disso, elevou Alfadle, que emergiu do esconderijo, ao califado com o nome de Almuti. Sem qualquer poder real, o novo califa foi efetivamente um governante fantoche que concedeu legitimidade ao regime buída.[15] Após a conclusão de um acordo de paz no verão de 946, os hamadânidas reconheceram Almuti como califa, mas no leste, os samânidas continuaram a reconhecer Almostacfi como califa até 955.[28] Almostacfi também foi cegado, aparentemente como um ato de vingança iniciado por Almuti,[29] e passou o resto de sua vida como prisioneiro no palácio califal, onde morreu em setembro de 949.[3][27][30] Algumas tentativas foram feitas para recuperar o califado de Almuti por membros da linha de Almoctafi, mas sem sucesso. Um dos sobrinhos de Almostacfi, Abu Nácer Ixaque, tentou iniciar uma revolta no Azerbaijão em 960, tomando o nome de califa Almostajir Bilá ("Buscando Apoio em Deus"), mas foi derrotado pelos governantes muçafíridas locais. Após a morte de Muiz Daulá em 967, o filho de Almostacfi e herdeiro designado, Alboácem Maomé, veio ao Iraque e conseguiu reunir um número considerável de seguidores escondendo sua identidade e alegando ser o Mádi, mas eventualmente foi descoberto e capturado. Embora tenha conseguido escapar, suas esperanças de conquistar o trono nunca foram realizadas. Isso marcou o fim das pretensões califais da linha de Almostacfi também.[31][32]
- ↑ Dias 1940, p. 289.
- ↑ Bowen 1928, p. 385.
- ↑ a b Özaydin 2006, p. 139.
- ↑ a b c d e f g h Bosworth 1993, p. 723.
- ↑ a b Busse 2004, p. 25.
- ↑ Kennedy 2004, p. 191–197.
- ↑ Busse 2004, p. 17–19.
- ↑ Busse 2004, p. 20–21.
- ↑ Busse 2004, p. 21–24.
- ↑ Kennedy 2004, p. 196, 312.
- ↑ Busse 2004, p. 23.
- ↑ Busse 2004, p. 23–24.
- ↑ Busse 2004, p. 24, 29.
- ↑ Donohue 2003, p. 8.
- ↑ a b c Bowen 1928, p. 392.
- ↑ Kennedy 2004, p. 196.
- ↑ a b Busse 2004, p. 19.
- ↑ Busse 2004, p. 19, 25.
- ↑ Kennedy 2004, p. 196, 215.
- ↑ Busse 2004, p. 25–26.
- ↑ Bowen 1928, p. 386.
- ↑ Bowen 1928, p. 386–387.
- ↑ Bowen 1928, p. 388.
- ↑ Donohue 2003, p. 13–14, 18.
- ↑ Bosworth 1993, p. 723–724.
- ↑ Busse 2004, p. 27.
- ↑ a b Bosworth 1993, p. 724.
- ↑ Busse 2004, p. 28.
- ↑ Busse 2004, p. 158.
- ↑ Busse 2004, p. 158–159.
- ↑ Busse 2004, p. 29.
- ↑ Donohue 2003, p. 56.
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Bosworth, C. E. (1993). «al-Mustakfī». In: Bosworth, C. E.; van Donzel, E.; Heinrichs, W. P. & Pellat, Ch. The Encyclopaedia of Islam, New Edition, Volume VII: Mif–Naz. Leida: E. J. Brill. pp. 723–724. ISBN 978-90-04-09419-2
- Bowen, Harold (1928). The Life and Times of ʿAlí Ibn ʿÍsà, 'The Good Vizier'. Cambrígia: Imprensa da Universidade de Cambrígia. OCLC 982525160
- Busse, Heribert (2004) [1969]. Chalif und Grosskönig - Die Buyiden im Irak (945-1055) [Caliph and Great King - The Buyids in Iraq (945-1055)] (em alemão). Vurzburgo: Ergon Verlag. ISBN 3-89913-005-7
- Dias, Eduardo (1940). Árabes e muçulmanos. Lisboa: Livraria Clássica
- Donohue, John J. (2003). The Buwayhid Dynasty in Iraq 334 H./945 to 403 H./1012: Shaping Institutions for the Future. Leida e Boston: Brill. ISBN 90-04-12860-3
- Kennedy, Hugh N. (2004). The Prophet and the Age of the Caliphates: The Islamic Near East from the 6th to the 11th Century (Second ed. Harlow, RU: Pearson Education Ltd. ISBN 0-582-40525-4
- Özaydin, Abdülkerim (2006). «Müstekfî-Bi̇llâh». TDV Encyclopedia of Islam, Vol. 32 (el-Münci̇d – Nasi̇h). Istambul: Turkiye Diyanet Foundation, Centro de Estudos Islâmicos. pp. 139–140. ISBN 978-975-389-454-8